Com o primeiro BRM das Bandeiras de 1000 kms concluído, eu já tinha atingido o máximo da quilometragem em provas no Brasil, era a hora de partir para LRMs internacionais e em 2015 se realizaria, nada mais e nada menos, do que a mais tradicional prova Randonneur do Mundo, o PBP Paris Brest Paris, que reúne de 4 em 4 anos mais de 6000 ciclistas de varias modalidades.
Ainda não havia viajado para a Europa, então seria mais uma novidade, além dos 1200 km a ser percorridos, minha primeira preocupação foi com a alimentação, será que na França tem coxinha e coca-cola? Kkkkkkkkkkk Não, não tem coxinha na França. Rsrsrsrs Sequer tem pão francês rsrsrsrs, o que mais se aproxima são as baguetes, tem muito croissant. Conversando com amigos com mais experiências internacionais conclui que não teria muitos problemas com alimentação.
Outra coisa a decidir era em qual dos tempos limites escolher, no PBP tem a categoria 80 horas, que larga antes de todos, 90 horas que larga em seguida e 86 horas, que larga na madrugada do dia seguinte. Estrategicamente a de 86 horas seria a mais adequada, pois a largada é num horário que estou mais acostumado e a que tem mais horas/dia, eu não gosto muito de pedalar a noite, porem havia algumas informações de como essa categoria larga depois de todos, os PCs já não estariam muito bem abastecidos de alimentação, então descartei. Como estava bem fisicamente, cogitei fazer a de 80 horas, mas pensei melhor e não riria dispensar 10 horas a mais numa prova que ainda não tinha experiência num pais desconhecido, então me inscrevi na de 90 horas.
Foram meses planejando tudo, a estratégia da prova, a viagem, o turismo, alguns dos brasileiros que se inscreveram liderados pelo Mestre Richard se juntaram e fizeram reserva no mesmo Hotel Pavillon em Plasir, cidade da região metropolitana de Paris a uns 8 km da Largada que seria em Saint Quentin en Yvelines, num dos melhores Velódromos do mundo, o Vélodrome Nacional de Saint Quentin , foi bem emocionante visitar o velódromo dias antes da largada. Chegamos em paris 4 dias antes da largada e fizemos um tur pela Cidade Luz
Tudo preparado, parti para a largada junto com o parceiro Nicolau, largamos as 17:30 em ponto, sem nenhum segundo de atraso, é espetacular o envolvimento dos franceses com o ciclismo, por muitos km na região urbana éramos aplaudidos o tempo todo por muita gente nas ruas que estava livres do transito de veículos, me senti no Tour de France.
Eu e o Nicolau seguimos no inicio sempre muito próximos, as cidades são muito belas, com aproximadamente uma hora de prova, numa curva em decida quase levei um rola, o pneus da frente descalibrou e tive que parar, completei a pressão com a bomba de mão mesmo pra seguir em frente, não resolveu muito tempo, tive que parar para trocar a câmera. Enquanto trocava a câmera uma ciclista de reclinada se aproximou parou e perguntou de eu precisava de ajuda em inglês, quando olhei pra ela, a surpresa foi que era a Leonor, brasileira, carioca e parceira do meu primeiro Brevet de 200 km, logo ela, de reclinada e ainda parou pra ajudar, falei que estava tudo certo e ela partiu e eu também logo e seguida.
Anoiteceu e eu estava muito bem, o primeiro PC foi em Villaines la Juhel a 220 km, encontrei o Janjacomo e o Daniel lá, me alimentei descansei um pouco e segui.
Apesar de ser verão, pegamos 8 graus na madrugada, sinceramente eu não esperava essa temperatura, nem preparado para ela eu estava, passei bastante frio na primeira madrugada, torcendo pra amanhecer e sair o sol pra esquentar um pouco, amanheceu, saiu o sol, mas nada de esquentar, aquele sol só servia pra clarear o dia mesmo, dia lindo por sinal, parei em um café onde havia outros ciclistas e tomei um café da manhã.
No caminho para Fougeres passamos por trechos do Tour de France que semanas atrás havia sido realizado, passamos por vários daqueles enfeites na rua no Tour, muito legal, me senti no Tour de novo rsrsrsrs e de quebra meu Strava estava registrando tempo nos seguimentos onde passaram os ciclistas Pro Tour rsrsrsrs, passei a 25 km h e eles a 45 km h kkkkkkkkkk. Fougeres é mais uma cidade muito bonita, cheguei lá bem desgastado por conta do frio na madrugada anterior já tinha sido 309 kms, não encontrei nenhum brasileiro. Durante todo o percurso existem muitas famílias que oferecem agua, café e até alimentação a beira da estrada, muitos aplausos durante todo o percurso, 1200 km de aplausos, até mesmo a noite ou de madrugada.
Durante o segundo dia, bateu um sono, tentei dormir em Tinteniac, 363 km, sem sucesso, segui para Loudeac, apesar de não ter conseguido dormir, descansei por 2 horas e me fez bem, cheguei em Loudeac ainda de dia onde estrava o Drop Bag, 440 km, me alimentei encontrei alguns brasileiros, no caminho até Loudeac havia encontrado o Dunga numa parada para o Café.
A intensão era dormir em San Nicolas Du Penen onde haveria um Posto de alimentação e dormitório, foi lá também o primeiro PC surpresa, comi bem lá, mas não consegui lugar para dormir então resolvi seguir para Carhaiz Plouguer, mudei a estratégia e tentaria chegar até Brest sem dormir, porem cheguei em Carhaix com muito sono, 520km, já era noite então resolvi dormir la, não era PC dormitório, mas os ciclistas se esparramavam no chão do refeitório, um ciclista estrangeiro me ajudou a me cobrir com a manta térmica que eu tinha levado, estava bem frio, dormi por 3 horas aproximadamente, acordei e comecei a me arrumar para seguir viagem, era madrugada, muitos dos brasileiros estavam lá, Carlão, Rafles, Fabricio, Nicolau, Smiling, Lowental. Traumatizado com o frio na noite anterior, falei para os outros que ia esperar amanhecer para seguir, foi quando o Emerson me falou que queria dormir mas precisava de alguém pra acordá-lo, juntou a fome com a vontade de comer, disse que ficaria com ele e dormi mais umas 2 horas. “Perdi” 7 horas nesse PC , então todo o meu planejamento foi por agua abaixo, estava um tanto atrasado, mas em compensação aquelas 5 horas de sono me recuperaram bem, subi a serra para Brest bem rápido, ultrapassando quase todos aqueles brasileiros que estavam em Carhaix.
Encontrei Smiling quando tirava fotos na ponte estaiada de Brest, e seguimos juntos até o PC, incrível como os franceses respeitam os ciclistas, numa pequena subida no trecho urbano de Brest, eu e Smiling demos passagem para os carros que nos muito lentos atrapalhávamos mas não teve jeito , eles nos esperaram com toda a paciência chegar no topo para passar pela gente com segurança, não nos espremeram entre a avenida e o meio fio como aqui no Brasil.
Me preocupei um pouco com o tempo pois chegamos em Brest faltando menos de uma hora pra fechar o PC, eu e mais alguns brasileiros almoçamos juntos e tentei dormir um pouco, novamente sem sucesso, descansei somente, por cerca de uma 1 hora. Parti de Brest com o sentimento que estava atrasado, vi o Emerson dormindo na grama, encontrei o Paulo Gouveia no caminho, na subida da serra encontrei o Rafles e seguimos juntos, vi o Richard, a Silvia Caetano e Carneiro seguindo no sentido contrario já que eles haviam largado no dia seguinte na turma das 86 horas, passamos por Carhais na volta, pelo segundo PC surpresa, por San Nicolas, nosso rendimento era bom e foi muito divertido pedalar esses quase 200 km com o Rafles, encontramos com o Carlão em San Nicolas, mas nos desencontramos quando seguiríamos. Chegamos em Loudeac a noite, o Rafles havia reservado hotel lá e resolver dormir um pouco, eu estava sem sono, então me alimentei, a fome era tanta que eu omi até os garfos kkkkkkkkkkk, me organizei com o Drop Bag e resolvi seguir em frente, no caminho encontrei o Roberto Trevisan, com mais alguns gaúchos, mas logo nos dispersamos
Era a terceira noite e essa foi bem sinistra, os ciclistas já não eram muitos na estrada, até ali sempre tinha muitos ciclistas na frente ou atrás, mas na terceira noite foi diferente, mas sempre tinha um ou outro passando, passei por uma cidade fantasma, tudo apagado, aquelas casas de pedra, escuras, sem ninguém, nem iluminação publica tinha, confesso que bateu um medo rsrsrsrsrs, cheguei em Tinteniac de madrugada, estava muito frio, tentei me esquentar numa fogueira alguns ciclistas rodeavam, um deles quando vou a bandeira do Brasil na minha camisa do Urban Velo, falou que eu deveria estar sofrendo com o frio, era impressionante como os europeus aguentam o frio, vi um grupo de Noruegueses pedalando somente de camisa em bermuda enquanto eu estava todo empacotado com a manta termina por baixo da roupa, dormi em Tinteniac e quando me preparava para seguir encontrei novamente com o Rafles que acabara de chegar e iria dormir um pouco.
Bora seguir se volta para Fougeres e Villaines la Juhel, ritmo tranquilo até encontrar um holandes e um pelote onde seguimos na roda deles bem rápido, até que o pelote diminuiu e eu e o holandês seguimos trocando roda bem forte, eu subia muito bem e ele tocava rápido no plano, passou rápido essa manhã, quando chegamos em Villaines, foi espetacular a recepção, parecia mesmo que eu estava no Tour de France, muitas pessoas nas grades, aplaudindo e incentivando os ciclistas, a cidade estava em festa, fomos muitíssimo bem tratados no refeitório, as crianças sempre prontamente nos ajudavam em que precisássemos foi muito legal aquilo, após comer aproveitei o sol pra esquentar e dormir um pouco antes de partir para Montagne au Perche
Cara… Eita lugar alto, foi a etapa mais difícil e numa fase onde já estávamos bastante desgastados, muita subida mesmo, PC muito bem organizado, encontrei o holandês lá, comemos juntos, mas depois nos dispersamos. Eu começava a dar sinais de grande desgaste, perguntei pra um policial local como era o caminho até Dreux e ele respondeu que eram bastante subidas e descidas.
A caminho de Dreux eu já não raciocinava direito, então resolvi seguir um grupo de italianos, depois de um tempo senti que os italianos, dois casais, estavam incomodados com a minha presença, sou tímido, falo pouco, ainda mais em outra língua, talvez se eu tivesse puxado conversa teria sido diferente, os italianos então deram um jeito de me despistar, dois fingiram que erraram o caminho, só para que eu passasse e fosse na frente, essa foi a minha impressão. Depois disso pedalei por um bom tempo sozinho, sem ninguém na frente e nem atrás, sumiram as placas, no PBP o caminho inteiro tem placas de indicação da rota, pensei que havia errado o caminho, esperei um empo e nada de aparecer um cliclista, era noite, até que apareceu um americano, que parou, falei pra em português que achava que estávamos fora da rota, ele me respondeu em inglês que também não tinha certeza, incrível como nos entendíamos falando cada um a sua língua, ambos sem GPS, até que apareceu outro americano com GPS e falou que estávamos certos, seguimos em frente então, logo surgiu o Thiago, de Santa Catarina, que estava com GPS e falava português, rsrsrsrs, deve ter sido enviado por Deus, pois era tudo que eu precisava, o sono apertava muito, surgiu um grande pelotão e seguimos nele, o pelotão andava forte, comecei a ter alucinações, umas apagadas em cima da bike, mas se eu sobrasse tinha medo de me perder, a cabeça não estava boa então arrisquei seguir, usando alguns truques, como mastigar alguma coisa, não urinar, pensar numa musica agitada, tudo isso dispersa o sono, mas não aconselho seguir no pedal com muito sono, um acidente pode te tirar da prova.
Enfim chegamos em Dreux, vi os italianos lá, aqueles… Refeitório bem estruturado, uma grande área para dormitório, pena que não tinha mais colchoes disponíveis, dormi no carpete mesmo, vocês não tem ideia que naquela situação de cansaço, o que menos importa é o colchão, dormi bem por umas 2 horas. Na saída encontrei o Carlão e o Fabricio chegando.
Era madrugada e também a ultima etapa, continuava com medo de se perder, então segui uma grande turma, mas estavam muito lentos, aquilo ia me dar sono, até que um casal de alemães numa tandem mais um outro ciclista passaram mais rápido, acompanhei os então, estávamos num ritmo bom, até maior que a minha capacidade, mas meu farol estava fraco, mas não queria perde-los , então não troquei a bateria, fui aproveitando as luzes deles até que amanheceu, aí deixei eles abrirem, parei, apreciei a paisagem, manha nublada, com neblina e o pensamento era que já tava ganho, faltavam pouco mais de 30 km, segui contemplando a natureza em volta, fui ultrapassado por alguns e segui até o final bem feliz por ter conseguido completar o feito, perto da chegada até ajudei outro ciclista que não sabia o caminho, os últimos 4 km eu já sabia como era, era parte do caminho do Hotel pra largada, cheguei por voltas das 8 da manhã.
A caminho da mesa pra carimbar o passaporte, encontrei o Nicolau e o Dinarte que seguiam pra Van que levaria ao hotel, perguntaram se eu queria ir junto, esperaram e aproveitei a “carona”, na mesa encontrei o Aizem e a Rosa que me parabenizaram e segui pro Hotel com o Dinarte e Nicolau com a Missão Cumprida.